O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), repudiou nesta quarta-feira (27) agressões e ameaças a jornalistas, físicas ou virtuais. Ele afirmou que parece haver uma tentativa de “milícias digitais” de coagir a imprensa tradicional, o que fere a liberdade de imprensa e o direito da população de obter informação com isenção.
“A liberdade de imprensa não é construída por robôs, o que é construído por robôs são as fake news”, disse. “Ao agredir os jornalistas, ao possibilitar que essas milícias digitais, se permitirmos isso, o que nós estaremos permitindo é um ataque à liberdade de imprensa”, afirmou.
O ministro participou do seminário “Liberdade de imprensa – Justiça e Segurança dos jornalistas” realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), com apoio da ESPM e da Faculdade de Direito da USP.
Moraes preside o inquérito do Supremo que apura ataques à Corte. Nesta quarta foi deflagrada operação da Polícia Federal para cumprir mandados judiciais contra empresários, blogueiros e parlamentares por suposta produção e disseminação de notícias falsas.
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“Hoje o que me parece é que essas milícias digitais, essas criminosas associações que se transformaram em milícias digitais nas redes, o que vêm fazendo e o que pretendem fazer é coagir a imprensa tradicional e os jornalistas tradicionais na sua liberdade de manifestação, na sua liberdade de crítica”, afirmou o ministro.
Moraes disse que “não podemos nos enganar nas coisas que aparentemente são difusas para coibir um dos pilares da democracia que é a liberdade de imprensa”.
“Estamos vivendo um momento extremamente preocupante em relação à liberdade de imprensa, não por atos formais governamentais de censura prévia, mas por algo muito mais perigoso, é algo que não é escancarado, a ameaça virtual e presencial a jornalista que venha a afetar a produção das ideias”, destacou.
Agressões a jornalistas
Moraes citou que é “de tamanho absurdo” jornalistas serem agredidos em manifestações e disse que nem correspondentes de guerra são agredidos. No início do mês, profissionais da imprensa foram agredidos durante manifestação antidemocrática com a presença do presidente Jair Bolsonaro.
O ministro comentou também a falta de segurança para os jornalistas que fez com que veículos de imprensa, entre eles o Grupo Globo, decidissem deixar o plantão do Palácio da Alvorada.
“Quando manifestantes ou populares passam a ameaçar jornalistas que estão aguardando em determinado local para entrevistar autoridades fazendo com que importantes meios de comunicação tenham que retirar seus jornalistas para garantir a segurança, isso nada mais é do que métodos instrumentais para se afetar a liberdade de imprensa”, disse.
O ministro do Supremo afirmou que “não se produz imprensa com jornalistas ameaçados, agredidos, sem segurança. Assim como não se produz uma justiça imparcial com magistrados, membros do Ministério Público acuados”.
Moraes disse ser preciso garantir a segurança e tranquilidade dos jornalistas. Segundo ele, não se pode aceitar ameaças virtuais e presenciais a esses profissionais como algo normal, ou estaremos abrindo mão da liberdade de imprensa.
Segundo Alexandre de Moraes, tais ameaças constrangem os jornalistas e facilitam que “somente notícias deturpadas, notícias falsas”cheguem à população.
Responsabilização criminal
Alexandre de Moraes defendeu a responsabilização de grupos que se associem de “forma criminosa” para propagar, na internet, discursos racistas, de discursos discriminatórios, de ódio e contra a democracia e as instituições democráticas.
“Não se pode censurar a liberdade de manifestação, de imprensa. Agora, as pessoas devem arcar com as consequências de seus atos. Não é possível que novas formas de mídia se organizem de forma criminosa, com finalidades de propagação de discursos racistas, de discursos discriminatórios, de ódio e contra a democracia e as instituições democráticas”, afirmou o ministro.
Segundo Moraes, “uma vez que ofendam, uma vez que pretendam desconstituir o regime democrático, instigar discursos de ódio, devem ser responsabilizados”.
Diálogo civilizado
O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, também participou do evento e disse ver com preocupação episódios de agressões a jornalistas.
“Violência é a incapacidade de manter uma interlocução civilizada. Quem recorre à violência geralmente não tem razão, ou mesmo que tivesse perde-a no momento em que usa a violência como um trunfo, como uma forma inaceitável de poder”, afirmou.
Barroso defendeu a revitalização do jornalismo profissional, “que sabe distinguir fato de opinião com honestidade e que faz o filtro necessário”. O ministro afirmou que a democracia tem espaço para liberais, conservadores e progressistas, porém, não deve ser leniente com a intolerância.
Jornalismo profissional
No seminário, o procurador-geral da República, Augusto Aras, disse ser hora de voltar a prestigiar o jornalismo profissional.
“Hoje um dos nossos maiores problemas é a desinformação como método, como incitação à violência, promoção da ignorância, da incivilidade, e isso nós não podemos aceitar”, afirmou.
Ao criticar ataques a jornalistas, Aras afirmou que, enquanto há a imprensa que busca “se fortalecer no contexto dos fatos”, “existem aqueles que se dizem jornalistas que usam de blogs para ocupar espaços na internet e que colocam verdadeiras aleivosias, que incitam a violência, a violência coletiva, a violência em particular e certas autoridades ou mesmo cidadãos do povo e merecem nosso reproche”.
Pilar da democracia
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, disse que “o pilar da democracia é a nossa imprensa livre” e criticou a necessidade de retirada de jornalistas do Palácio do Alvorada por falta de segurança.
“Isso é gravíssimo, por si só fala sobre a gravidade do momento, e nós temos que estar organizados em todo o Brasil para defender concretamente perante o Judiciário aqueles que merecem essa defesa as liberdades, que merecem nossa vigilância”, avaliou.
O presidente da OAB disse que esta quarta-feira é um dia marcante, em razão da operação da Polícia Federal.
“Essa operação também é uma resposta. A defesa da democracia exige vigilância e coragem, instituições fortes e resolutas. Tibieza, fraqueza levam a processos históricos como foi a ascensão do nazismo”, afirmou.
Por G1