Em audiência judicial nesta terça-feira (17), no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), terminaram sem consenso as negociações para o principal acordo para reparação da tragédia de Brumadinho. Nas últimas semanas, as partes falaram em avanços nas conversas, gerando expectativa em torno de uma possível conclusão das negociações, o que não ocorreu.
Nova audiência foi marcada para 9 de dezembro, na sede do TJMG, em Belo Horizonte.
Participam das tratativas o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), as Defensorias Públicas do estado e da União, a Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais e a Advocacia-Geral da União (AGU), além da mineradora Vale, responsável pela tragédia. No episódio, ocorrido em 25 de janeiro de 2019, cerca de 11,7 milhões de metros cúbicos de rejeitos vazaram após o rompimento de uma barragem na Mina Córrego do Feijão, gerando destruição e danos a comunidades e ao meio ambiente de Brumadinho e de outras cidades da calha do Rio Paraopeba.
Desde então, foram resgatados 259 corpos de vítimas da tragédia, mas ainda há 11 desaparecidos.
O procurador-geral do MPMG, Antônio Sérgio Tonet, informou que foi discutida na audiência uma contraproposta apresentada pela Vale. “Estabelecemos os pontos convergentes e apresentamos os pontos divergentes. A Vale pediu um prazo para se manifestar novamente, e o Tribunal de Justiça marcou nova audiência de conciliação.”
Com base em um estudo da Fundação João Pinheiro, que é ligada ao governo de Minas, as instituições da Justiça calcularam as perdas econômicas em R$ 26 bilhões e pleiteiam mais R$ 28 bilhões para cobrir danos morais sociais e coletivos, totalizando R$ 54 bilhões.
Segundo o secretário-geral do estado de Minas, Mateus Simões, a contraproposta da Vale trouxe valores bem mais modestos, mas este não seria o principal entrave do acordo no momento. “Não estamos dispostos a aceitar que Brumadinho se transforme em uma segunda Mariana. Este não será um acordo feito para não ser cumprido. Precisamos de um acordo efetivo e factível. Os valores só serão discutidos depois que superarmos as questões de governança”, afirmou Simões.
Para o secretário, a contraproposta apresentada pela Vale, que chega em números totais a R$ 21 bilhões, traz um valor muito distante do necessário. “Mas eu não acho que o problema no momento seja este. A questão central é a governança, é o formato do acordo. Não aceitaremos uma segunda Fundação Renova”, enfatizou o secretário.
A Fundação Renova atua na reparação dos danos da tragédia no município mineiro de Mariana, ocorrida em 5 de novembro de 2015 após o rompimento de uma barragem da Samarco deixar 19 mortos e causar impactos sociais, econômicos e ambientais em diversos municípios da Bacia do Rio Doce, até a foz no Espírito Santo. A entidade foi criada conforme termo de transação e ajustamento de conduta (TTAC) firmado em março de 2016. Participaram do acordo a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, o governo federal e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. Na época, o Ministério Público estadual e o federal (MPF) foram contra os termos negociados.
Dias após a tragédia de Brumadinho, o MPF chegou a se manifestar publicamente, colocando-se contra a criação de mais uma entidade similar à Fundação Renova. O MPF critica a interferência da Samarco, da Vale e da BHP Billiton no processo reparatório de Mariana. “A Fundação Renova, no papel, é uma entidade independente, mas, na nossa visão, não tem mostrado essa independência diante das empresas”, disse, na ocasião, o procurador Helder Magno da Silva.
Em nota, a Vale afirmou que as partes mantiveram um diálogo construtivo na audiência de hoje. “Ainda não há definição de valores para um eventual acordo”, destaca o texto.
As tratativas preocupam os atingidos pela tragédia. Por meio da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), do Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab) e do Instituto Guaicuy, eles têm cobrado o direito de participação nas negociações, por entender que as decisões que serão tomadas vão interferir diretamente em suas vidas. As três entidades, que foram escolhidas pelos próprios atingidos para assessorá-los, defendem que os termos do acordo sejam tornados públicos e que existam espaços abertos para discuti-los.
Auxílio emergencial
A Vale também informou que, na audiência de hoje, foi acordada a extensão do pagamento do auxílio emergencial por mais um mês. Tais repasses foram estabelecidos em um termo de ajuste preliminar (TAP) firmado no dia 20 de fevereiro do ano passado, pouco menos de um mês após a tragédia de Brumadinho, e não se confundem com as indenizações individuais.
Inicialmente, tinham direito ao benefício todos os moradores de Brumadinho, sem distinção. Nos demais municípios atingidos, o auxílio foi concedido a pessoas que residem a até 1 quilômetro de distância da calha do Rio Paraopeba. O valor era de um salário mínimo por adulto, a metade dessa quantia por adolescente e um quarto para cada criança. Conforme o TAP, os pagamentos mensais eram assegurados por até um ano após o rompimento da barragem, ou seja, 25 de janeiro de 2020.
Em novembro de 2019, após a mobilização dos atingidos, o período de pagamento do benefício foi estendido até 25 de outubro deste ano, em um novo acordo com a Vale. Com a prorrogação, foram pactuadas novas regras, com os valores mantidos para pessoas que residiam nas comunidades diretamente afetadas pela lama e para os atingidos acolhidos em algum programa de reparação, mas reduzidos pela metade para os demais beneficiados abarcados pelo critério original.
No curso das negociações em torno do principal acordo de reparação, ocorreram mais duas prorrogações. A Vale chegou a se manifestar pelo fim do auxílio, porém, terminou concordado em efetuar o repasse em novembro e, agora, também assegura que o fará em dezembro.
Conforme dados da mineradora, cerca de 106 mil pessoas vêm recebendo auxílio mensal.
Edição: Nádia Franco
Fonte: Léo Rodrigues – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro
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