Em entrevista Janaina Pascoal afirma que é preciso “Boas Propostas” e menos “Brigas”

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Brasília - A advogada de acusação, Janaína Paschoal, fala durante o quinto dia do julgamento final do processo de impeachment da presidenta afastada Dilma Rousseff, no Senado Federal (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Atacada pela esquerda e pela direita, a deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP) diz que o campo conservador teve resultado aquém do esperado na eleição de 2020 porque os eleitores se cansaram do estilo que chegou ao poder com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

 “Falta um pouco de conteúdo, e precisa de menos rede social, menos pancadaria“, afirma à reportagem a parlamentar da Assembleia Legislativa de São Paulo, que recebeu mais de 2 milhões de votos em 2018, empurrada pela fama de coautora do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT).

Janaina diz sofrer mais pressão para apoiar o impeachment do governador João Doria (PSDB) do que o de Bolsonaro. E defende que a Assembleia dê resposta ao caso da deputada Isa Penna (PSOL), apalpada no plenário por Fernando Cury (Cidadania).

Sobre 2022, descarta tentar a reeleição na Assembleia e afirma: “Se a eleição fosse hoje, eu concorreria ao Senado”.

Pergunta – Qual sua leitura sobre os resultados da direita em 2020?

Janaina Paschoal – Houve uma decepção com pessoas que se apresentaram como nova política e um retorno para os políticos tradicionais. Essa coisa de muito bater, muita internet, alvoroço, cansou a população.

É tudo muito teatral, jogar para a torcida. E fazer as coisas andarem exige trabalho, negociação, diálogo. São pessoas que vivem no mundo virtual e não entendem que há um processo legislativo.

A população criou uma expectativa grande em relação a essa direita que chegou ao poder e viu que ela não consegue dar andamento para as pautas. Falta um pouco de conteúdo, e precisa de menos rede social, menos pancadaria.

O excesso de atritos dentro da direita, que a sra. critica, não era previsível pela forma como Bolsonaro articulou apoios e venceu?

JP – Sim, mas acho que poderia ter sido menos, se eles tivessem sido mais habilidosos, ficado mais fiéis às pautas, com menos confusão, menos ações para afastar de maneira traumática pessoas que apoiaram, como o [ex-ministro Gustavo] Bebianno.

É necessário ouvir quem pensa diferente. Essa postura intransigente, típica do petista, virou a postura do bolsonarista, de uma maneira muito agressiva. No lugar de aprender com os erros, repetem os erros. E a gente tenta ajudar e sofre resistência.

Considera estelionato eleitoral a guinada de Bolsonaro, da antipolítica para o centrão?

JP – Aquele discurso dele de apolítica é inadequado numa democracia, numa República. O fato de rever aquela postura eu vejo como positivo. A gente só tem que ver aonde isso vai.

A aliança inclui indicações para cargos.

JP – É, o perigo é ver se vai trocar e ainda colocar gente desqualificada nas funções.

Em maio a sra. defendeu a renúncia do presidente. Continua favorável?

JP – Ele estava muito intransigente em relação à doença [Covid-19], chamando de gripezinha, falando tudo errado. Depois, ele liberou o auxílio emergencial, mostrou uma responsabilidade no sentido de não abandonar a população.

Ele foi por uma linha no Ministério da Saúde que é a do tratamento precoce. É polêmica, mas eu defendo. Tive Covid [em abril], fiquei em casa esperando e quase morri.

O discurso minimizando os benefícios da máscara e do distanciamento social não acaba prolongando as consequências da doença?

JP – Digo o seguinte: esse discurso dele não me agrada. Sigo crítica. O que acho é que, apesar disso, ele cumpriu o seu papel institucional.

Vê a atuação dele na pandemia como motivo para impeachment, como sustenta a oposição?

JP – Ainda não me convenço de haver elementos. Todo dia eu recebo emails para pedir o impeachment do Bolsonaro e, num número muito maior, para pedir o impeachment do Doria.

Acho que eles divergem em vários pontos, concordo com um em alguns, com o outro em outros. Mas ainda não vejo motivo para impeachment nem de um nem de outro.

A Assembleia ficou mais independente em relação ao governo, como se previa no início da legislatura?

JP – Ah, com certeza. Estão tendo muito mais trabalho, têm que debater mérito, dar satisfações. Não estavam acostumados.

Tem a ver com a entrada do PSL, uma oposição que não é da esquerda?

JP – Sem sombra de dúvida. E eu fico ali de guardiã, né? As pessoas cobram muito que você aja por bloco. Sou uma criatura muito só. Não é questão de bancada, é questão de ser justa. Olhar os projetos e debatê-los.

A sra. critica o acordo entre PT e PSDB para a mesa da Assembleia e colocou sua candidatura a presidente da Casa em 2019. Fará isso novamente?

JP – Estou tentando ver se algum colega mais antigo na Casa, um nome mais neutro, quer enfrentar. Apesar de ter um diálogo positivo com todo o mundo, porque é muito da minha natureza ouvir e debater, o meu nome tem muita resistência, principalmente da esquerda, o PSOL.

A sra. diz que não se manifestará sobre o caso Isa Penna porque mais adiante pode ser obrigada a votar o tema em plenário. De modo geral, como vê o ocorrido?

JP – Tem que ter uma resposta, uma análise. Não pode fingir que nada aconteceu.

Não é só uma questão das partes, mas uma situação da Casa, que fica fragilizada institucionalmente. Estávamos em plenário no meio de uma votação importante [do orçamento]. Como acontece uma situação assim?

Naquele dia, deputados consumiram álcool na Assembleia, como diz Isa?

JP – Foi em um gabinete. Não vi diretamente, mas ouvi vários relatos. As pessoas viram, inclusive das janelas dos gabinetes. Senti um colega alterado [Janaina não quis citar nomes, mas diz que que não era Cury]. Na hora, pensei que era um caso isolado. Depois começaram relatos de que foi uma coisa orquestrada, deliberada, como se quisessem mesmo embriagar os colegas. E se houve um objetivo?

É um caso muito importante. Sei que as colegas estão indo mais por essa questão sexual, mas, para mim, o problema é maior. Tem uma discussão prévia: por que ele estava naquele estado, por que aquilo aconteceu?

No dia em que o caso foi revelado, a sra. teve uma altercação com o deputado Carlão Pignatari [PSDB, líder do governo] e respondeu a ele que não é prostituta. Enxergou tentativa do governo de ‘comprar’ seu voto em favor da aprovação do orçamento?

JP – Achei o telefonema [de uma assessora da liderança sugerindo que a deputada cadastrasse um projeto que ela defende para receber recursos de emenda] inadequado.

Eu vinha obstruindo [a votação] de maneira transparente. Se tivessem me dito que era por emenda, eu teria indicado nas minhas emendas impositivas. E aí passou o prazo. Fiquei nervosa porque não admito isso. Meu voto é de convicção, de consciência. Nunca pedi nada.

Votei contra o orçamento porque não concordo com o aumento da verba destinada à publicidade. Entendo a necessidade de fazer cortes, mas não tem lógica cortar saúde, educação, e aumentar propaganda. É meu estilo de trabalho. Bolsonaro, por exemplo, eu não jogo pedra em tudo o que ele fala ou faz. Doria e [Bruno] Covas, idem. Elogio bons projetos, critico outros.

A sra. pediu que o deputado nunca mais lhe dirija a palavra. Mantém a decisão?

JP – Olha, tenho tido várias decepções na maneira como ele conduz diversos processos. Vamos aguardar. Mas não acho que ele [favorito para virar presidente em 2021] seja a melhor pessoa para dirigir a Casa.

Qual o seu projeto para 2022?

JP – Não tenho nada definido, até porque não sei se vou ter legenda. A vida partidária é um inferno. É muito jogo de vaidade e poder, indefinição. Eu odeio isso, sabe? Acho que a estrutura partidária teria que ser revista. Mais do que nunca, defendo as candidaturas avulsas.

Se a eleição fosse hoje, eu concorreria ao Senado. Não concorro mais a deputada estadual. Isso é uma decisão. Consegui a duras penas a lei que dá direito às mulheres de escolha da via de parto. Aí o Tribunal de Justiça derrubou. O [deputado estadual] Campos Machado [Avante], por inveja, porque não admite que tive mais votos nem abaixo a cabeça para ele, entrou com uma ação. Não vou mais passar por isso.

A sra. diz que todo dia recebe mensagens de eleitores seus pedindo o voto de volta. Qual é sua base hoje, dado que a sra. é rejeitada por bolsonaristas e pela esquerda?

JP – Não sei. O que eu posso fazer é me voluntariar. Se o povo quer votar, vota. Se não quer, eu tenho vida anterior [como advogada e professora]. Não tenho essa preocupação de ser eleita.

Não saio a deputada federal porque acho impossível fazer um trabalho de qualidade no meio de 500 pessoas. Vejo um papel para mim no Senado. E aí o povo e Deus decidem, porque no final é sempre Deus.

Em um desabafo no Twitter, a sra. falou das cobranças que vêm de todos os lados e disse que talvez não dê para a política. Que balanço faz do mandato?

JP – Acho que é um trabalho muito útil. Consegui melhorar projetos, estimular o debate de ideias. É uma satisfação. Por exemplo, fui lá no governo defender um projeto para acelerar a adoção que acabei de apresentar. Hoje há muitas dificuldades para quem quer adotar. A gente tem que acabar com tanta burocracia, tantas restrições.

Mas ainda sinto falta de maturidade da população, que quer reação em bando. Ou você é Bolsonaro ou é contra; ou é Doria ou odeia; ou é esquerda ou é direita. Não querem que você explique as coisas, as frases têm que ser todas muito curtas.

Em quem a sra. votou para prefeito da capital?

JP – No [Bruno] Covas, mas não foi um voto de convicção, porque acho que o PSDB já domina muito em São Paulo. Precisava ter uma oxigenação. Tentei conversar com o [Guilherme] Boulos [PSOL], convidei para uma live, não tive resposta.

Foi a disputa da centro-esquerda contra a esquerda. Por causa da inabilidade da direita, não tivemos uma candidatura.

Bolsonaro apoiou Celso Russomanno (Republicanos). O que achou?

JP – É duro, não gosto de falar mal das pessoas, mas os debates mostravam que ele não tinha condições para ocupar o cargo.

RAIO-X

Janaina Paschoal, 46

Advogada, é professora licenciada de direito penal na Faculdade de Direito da USP, onde fez sua graduação e doutorado. Trabalhou na Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e no Ministério da Justiça antes de abrir seu escritório. Tornou-se conhecida por ser coautora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff (PT). Exerce seu primeiro mandato na Assembleia Legislativa de São Paulo.