A produção agrícola brasileira depende hoje de 85% de fertilizantes importados para se viabilizar.
E no caso específico do potássio, crucial em todas as culturas agrícolas, a dependência do insumo importado chega a 96%. Esses foram os dados apresentados por Luiz Rangel, que representou o Ministério da Agricultura no debate que a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado promoveu nesta terça-feira (24).
De acordo com os dados e projeções apresentados por Rangel, esse quadro de dependência externa deve se manter por um longo tempo: o Plano Nacional de Fertilizantes, apresentado recentemente pelo governo federal, prevê que a dependência de fertilizantes importados diminua para 50% em 2050. “E isso se todas as ações desse plano forem bem-sucedidas”, frisou o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), que presidiu a audiência pública.
O debate aconteceu a pedido de Vanderlan e também dos senadores Jaques Wagner (PT-BA) e Zequinha Marinho (PL-PA).
Sanções
Segundo o representante do Ministério da Agricultura, a dependência externa de fertilizantes começou a se tornar mais problemática no ano passado, devido às sanções ocidentais contra Belarus (ou Bielorrússia), país do qual o Brasil estava importando cerca de 19% do que aplicava na produção agrícola.
A situação piorou em 2022 a partir das sanções contra a Rússia, que responde por aproximadamente 23% das importações brasileiras de fertilizantes.
As sanções têm contribuído também para a explosão dos custos de importação. Segundo Luiz Rangel, na prática o Brasil não consegue mais importar de Belarus, e as importações da Rússia ainda não foram afetadas, mas a entrega está bem mais lenta.
Falta de investimentos
Para vários participantes do debate, essa dependência explicita erros cometidos nas últimas décadas pelo Brasil.
O senador Jaques Wagner, por exemplo, criticou a decisão da Petrobras, adotada nos últimos anos, de abrir mão de fábricas de fertilizantes em diversos estados, com o objetivo de privatizá-las ou desativá-las.
“Nossa dependência é consequência da falta de investimentos. Não podemos fazer privatizações apenas como troca de ativo. Precisamos de investimentos de pessoas que ampliem o que temos, e não [somente para] fazer caixa. Porque aí muitas vezes a empresa que compra não tem o capital necessário para ampliar os investimentos. Infelizmente, a lógica com que a Petrobras funciona hoje é ficar publicando lucro em cima do aumento do preço dos combustíveis, e também da alienação de um volume enorme de ativos que vão nos fazer falta depois”, alertou Jaques Wagner.
Ex-consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Paulo César Ribeiro Lima foi outro debatedor que criticou a gestão recente da Petrobras, onde ele também trabalhou. Ele disse que os lucros que a empresa obtém com a política de preços de importação e a venda de ativos não se tornam investimentos estruturais no país.
“Só no primeiro trimestre de 2022 o lucro foi de R$ 44,5 bilhões, e de dividendos distribuíram R$ 48 bilhões. É transferência de ativo, de renda. Você vende e ainda entrega para acionista estrangeiro. E a Petrobras não investe. Aonde é que tinha de estar indo esse lucro? Tinha de estar indo para terminar a unidade de Fertilizantes III, para continuar o projeto da IV e da V em Uberaba e Linhares. Tinha de estar indo para o Paraná, porque não é simples pegar a Ansa [empresa de fertilizantes no estado vinculada à Petrobras] e voltar a operar, não”, protestou Paulo César.
Insumos nacionais
O senador Lasier Martins (Podemos-RS), por sua vez, defendeu a exploração de insumos nacionais.
“Quando criamos a Comissão Nacional de Mineração, foi dito que temos no nosso subsolo soluções para tudo, tantos são os minérios que temos. Então quero perguntar por que continuamos discutindo de onde vamos buscar agora o potássio, o nitrogênio, o fósforo, se temos tudo isso? Tenho ouvido dizer que custa mais barato importar que buscar aqui no nosso subsolo. Então a pergunta é simples: o que falta para nós explorarmos o potássio? No Rio Grande do Sul temos minas de potássio em grande quantidade. Já que somos autossuficientes em todos esses insumos, o que precisamos fazer para resolver o problema? Vamos continuar buscando no Canadá, no Irã, na Ucrânia?”, questionou o senador.
Representante da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Gerson Castellano defende que a Petrobras retome a produção de fertilizantes no Paraná, em Mato Grosso e em Sergipe, que hoje está paralisada.
E Marcus Sidoruk, do Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário (Sinpaf) também argumentou que o Brasil deveria priorizar a superação da dependência externa.
“Essa dependência deixa a economia nacional, fortemente apoiada no agronegócio, vulnerável às oscilações do mercado internacional de fertilizantes. Essa situação deveria ser um alerta para o país em termos da necessidade de políticas que diminuam a dependência de fertilizantes importados. Mas, ao longo dos anos, o baixo custo da importação e o fornecimento desses produtos por outros países levou à descontinuidade da produção local, colocando em risco nossa soberania. A indicação de políticas para a diminuição da dependência sinaliza para um arranjo de maior sinergia entre os setores mineral e agrícola nacionais”, afirmou Marcus Sidoruk.