Cerca de 200 mulheres do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) fizeram um protesto na sede da empresa Salton, na tarde desta quarta (8), na zona oeste de São Paulo. A ação contra uma das principais vinícolas do Brasil, implicada no caso de trabalho escravo no Rio Grande do Sul, acontece no Dia Internacional da Mulher e faz parte de uma jornada que durará todo o mês de março.
Vestindo blusas pretas e lenços de chita no rosto, as trabalhadoras rurais fizeram intervenções com cantos e gritos de ordem na frente da sede da empresa na Avenida Pacaembu. Em uma faixa, pintaram um cálice com os dizeres “vinho tinto de sangue”.
Na escadaria da entrada, foram colocadas caixas com verduras agroecológicas e balões de tinta vermelha pintaram a fachada do casarão. Mãos pintadas de vermelho marcaram a vitrine que expunha, sob um arranjo com taças penduradas, as garrafas da vinícola.
“É preciso denunciar o trabalho escravo, identificar quem são essas grandes empresas e reivindicar essas terras para reforma agrária, para proteção de alimentos saudáveis e matar a fome da população, porque isso também está no nosso lema: o combate à fome e à miséria. É nesse contexto que a gente segue fazendo a denúncia das empresas”, afirma nota da direção do MST.
Iniciada na madrugada de 1º de março com uma ocupação de terra em Itaberaba (BA), a jornada das mulheres do MST inclui, além de ações diretas, marchas, feiras, plantio de árvores e distribuição de alimentos. Com o lema “O agronegócio lucra com a fome e a violência: por terra e democracia, mulheres em resistência!”, as atividades acontecem em ao menos 23 estados.
Foto: Reprodução/Twitter
“A jornada deste ano vem afirmar que a reforma agrária, que as mulheres, que a agroecologia, que a produção de alimentos saudáveis é a nossa aposta em detrimento de um modelo que lucra, explora as relações humanas, que tem as violências como seu principal mote de vida e que têm a fome, a exploração, o trabalho escravo como esse elemento de extração de tudo que é da vida em nome do lucro”, destaca Renata Menezes, integrante da direção nacional do MST.
Agronegócio e trabalho análogo ao escravo
A Salton, pertencente à família de mesmo sobrenome, é uma das três maiores vinícolas, ao lado de Aurora e Garibaldi, que tinham contrato com a Fênix, prestadora de serviço flagrada submetendo 207 trabalhadores a condições análogas à escravidão na carga e descarga da uva, em Bento Gonçalves (RS).
O caso veio à tona no último 22 de fevereiro, com uma operação de resgate que foi possível depois que três trabalhadores fugiram e fizeram a denúncia. Entre as violências impostas a eles e seus colegas, estavam agressões com choques, spray de pimenta e cassetetes.
Depois de oito dias sem se posicionar, a Salton soltou uma nota dizendo que não vai adotar “posição omissa” em relação ao episódio e que repudia “veementemente qualquer ato de violação dos direitos humanos”.
Em 2022, a vinícola – fundada em 1910 – teve seu recorde de faturamento, alcançando R$ 500 milhões. No mesmo período, a Aurora faturou R$ 756 milhões e a Garibaldi, R$ 256 milhões. No total, as três empresas envolvidas com práticas escravagistas faturaram R$ 2 bilhões apenas no ano passado.
“Não adianta você ter terras produtivas, se nelas estão contidas trabalho escravo. Não adianta a gente ter grandes produções orgânicas se nessas lavouras, se nesse modelo de produção, ali está contido relações que são frutos de violência. Não adianta a gente pensar qualquer tipo de produtividade, com relação a terra e natureza, se ela tem a exploração da biodiversidade com a lógica do lucro, com a lógica do capital”, complementa Renata Menezes.
Posicionamento da Salton
Procurada, a Salton se manifestou por meio de nota. O texto afirma que a empresa “repudia veementemente qualquer forma de violência que ameace a integridade dos seus colaboradores e consumidores”, ainda que o protesto tenha se dado de forma pacífica. Leia a seguir a nota na íntegra:
Em relação ao fato ocorrido hoje (08/03) em frente à sua loja, em São Paulo, a Salton reforça que repudia veementemente qualquer forma de violência que ameace a integridade dos seus colaboradores e consumidores. A vinícola vem trabalhando em total colaboração com MPT para construir compromissos sólidos, além de reparações aos danos sofridos pelos trabalhadores da empresa Fênix, no resgate ocorrido no alojamento da prestadora de serviços.
Edição: Rodrigo Durão Coelho